Relato Kajuraho
TRANSPORTE – UMA EXPERIÊNCIA CHAMADA ÍNDIA
Tudo começa as 22:30hs, com um Tuc-Tuc, lembre-se na índia e quase impossível andar a pé e lá estão eles se oferecendo pra ti levar pra algum lugar, esse motorista prometeu que nos levaria de qualquer forma até a estação de Agra. Nosso trem sairia as 00:20hs ele chegou ao hotel as 22:30 dizendo, temos que ir logo, não podemos perder o trem...
E lá fomos nós, a estação à noite estava muito fria, ratos passavam pelos trilhos procurando comida, nas plataformas as vacas, cachorros e mendigos disputavam os restos de comida e no vai e vem das pessoas nos encarando, num carrinho um senhor preparava um chapati na hora, do outro lado os homens acendiam a fogueira para esquentar a alma e num painel eletrônico, os trens eram anunciados, hora de chegada e de partida...
O nosso não aparecia, me preocupava, perguntava pra um, perguntava pra outro, ninguém sabia, até que um indiano disse, vai aparecer no painel mais tarde... Continuávamos a espera, as mães levavam as crianças para defecar na beira da plataforma, do lado homens urinavam, Sadhus passavam pedindo oferenda e no painel nada do informe, até que faltando dez minutos do embarque surgiu a informação bombástica: o trem iria atrasar duas horas, a neblina já cobria a estação, tínhamos que nos abrigar, já imaginava que a noite seria longa, fomos para uma sala de espera, onde era permitida a entrada só para quem havia comprado a passagem da classe Sleeper, um senhor sem perna checava nosso nome na lista, permitiu nossa entrada, mas não tinha lugar para sentar, jogamos as mochilas no chão e lá ficamos a olhar os informes, entrava gente e mais gente!
Não sabia como todos caberiam ali, os indianos cobriam o chão com panos e lá deitavam, famílias inteiras, um coreano entrava e saia da sala, devia ser claustrofóbico, não entendendo aquele caos coletivo, do lado tinha um banheiro e o cheiro de urina se expandia pela sala... Má noticia, o trem iria atrasar mais uma hora...
Turistas entravam e deitavam no chão, tiravam fotos da situação que se encontravam e lá mesmo dormiam, a porta não parava fechada e o vento frio entrava e congelava minhas pernas, de repente acabava a força da estação, tudo escuro, logo voltava, algumas indianas passavam me olhando, depois vinha um irmão bravo gritando comigo, perguntando "What' s country?" depois se afastava, gente saia, gente entrava, o porteiro limpava o quitoco do joelho...
Má noticia, eu acho que disse isso antes... O trem atrasaria mais duas horas, as meninas piscavam os olhos, o senhor da porta sumia, os motoristas do tuc-tuc vinham oferecer seu serviço, eu dizia: "Mas eu nem fui ainda!" eles riam...
O coreano voltava a entrar assustado, um indiano mascando pittel passava e cuspia do lado, ia buscar um nescafe para esquentar a alma, já era quase seis da manhã e mais um aviso, só as sete o trem chegará... Esse seria o horário que estaríamos chegando a Mahoba...Oh tragédia!
Sentava, levantava, gente saia, gente entrava, como uma bola de neve os trens iam se atrasando, até que finalmente ele apareceu, sua buzina inconfundível, os indianos se amontoavam na porta, uns tentavam sair, outros tentavam entrar, nesse instante estávamos procurando nosso vagão, achamos, agora procurávamos nossas camas, achamos, mas ocupada, um roncava, o da cama de baixo escondia a cara e fingia dormir, esperamos o fiscal para tirar o espertinho, é assim que funciona aqui, uma família inteira para viajar em uma cama e se aproveitam de camas vazias, até o dono chegar e o fiscal do trem os expulsar...
O trem partiu, sacamos da mochila os cobertores e fomos dormir! Na cama ao lado sentados em posição de Buda indianos sem dente conversavam, pelo corredor passava um vendedor de chai gritando, aquele trem pulsava, uma veia, mais que uma veia: um coração vibrante, na cama de baixo do nosso lado, sentava uma senhora, depois ela trocava de lugar com a filha, que depois trocava de lugar com a sogra, até que todos sumiam e surgia um novo viajante... E depois surgiu uma senhora com seu filho que comia bolacha com água e a meleca do nariz junto, a serpente azul parava no meio do nada, do lado passava um trem veloz, buzinando, só havia um trilho num complexo sistema ferroviário. O nosso trem chacoalhava e depois de alguns minutos voltava a se locomover.
Tentava dormir, o trem vira e mexe parava, pessoas dormiam no corredor, no chão, na cama do lado um senhor roncava, o paria viajava agachado do lado do banheiro encardido, em alguns momentos tentava olhar pela janela, até um senhor fechá-la na minha cara, dizendo: "Olhe da minha que é melhor!", o barulho do trem era uma música frenética, a viagem que levaria seis horas acaba levando oito...
Até que enfim chegamos a Mahoba, um Tuc-Tuc rápido nos leva até a parada de ônibus, só o tuc-tuc funcionava nesse país maluco... Mas o ônibus havia partido... O motorista acelera e consegue encontra o ônibus no meio do caminho... As malas foram para cima do ônibus, entramos, tudo caindo aos pedaços, o chão coberto de amendoim e pó, seguimos, o cobrador gritava: "Chalai, Chalai" o ônibus ia lotando, aqui na índia tudo lota, lindas mulheres vestidas de sare entravam, o ônibus passava por uma estrada de terra, a poeira invadia o ônibus, os homens passavam gel no cabelo e se penteavam, mais a frente o ajudante do cobrador jogava pra cima do ônibus vários botijões de gás.
Passávamos por diversos vilarejos, casas com telhado de terra, pastores levando suas cabras pela estrada, os amendoins eram fritos nos estercos de vaca, crianças iam de bicicleta para a escola, lojas vendiam roupas, tão empoeiradas quanto as que eles vestiam...
Até que subiu no ônibus o ilustre Daniperi (Um Bode) que ficou do meu lado e a viagem seguia, a estrada era infinita, passávamos por plantações de trigo misturada com oliva, campo verde e dourado, o sol já ia sumindo do horizonte... Já fazia duas horas e a cabra do meu lado, crianças sorrindo, uma escola onde o professor lecionava em cima da laje, mulheres carregando pedras na cabeça, homens deitados em gramados se aquecendo no último suspiro do sol... As meninas apavoradas rezavam imaginando que não chegariam a lugar nenhum naquele ônibus, então perguntei ao cobrador: "Khajuraho está próximo?" "Faltam só cinco quilômetros!" Cinco quilômetros na Índia pode levar horas...
E a estrada continuava infinita, barbeiros nas ruas trabalhando e mais vilarejos caóticos, tudo ficou escuro, pequenos pontos de luz no horizonte... Foram 7 horas de espera na estação de trem, 8 horas de viagem de trem e 5 horas de ônibus... A estrada era infinita e a experiência inesquecível... O ônibus finalmente parou e o cobrador disse: “Chegamos a Khajuraho!”
DA TERRA DO SEXO!
Quando descemos do ônibus nada enxergávamos, a escuridão era demasiada naquele terminal, percebemos um senhor se aproximar, dizendo sobre o seu hotel, que precisávamos caminhar algumas quadras para chegar até lá, fomos atrás dele, com um pequeno receio (Do tamanho do mundo!), atravessamos um imenso descampado, e sempre perguntava: “Estamos chegando?” “Está perto!”, depois do descampado saímos numa rua semi-iluminada, pessoas vinham nos cumprimentar, oferecer haxixe, até que chegamos a um pequeno hotel com bandeiras coreanas, mais uma vez o medo paulistano nos corroendo inutilmente, era lá que íamos passar a noite!
Na recepção um imenso mapa ilustrativo da região. Na hora do jantar pedimos uma porção de batatas e uma cerveja, para tomar escondido é claro, encontramos um inseto tostado no meio da porção, mas a fome era tanta e em se tratando de Índia, aquilo não mais importava, pedi também um palak panner...
O hotel estava repleto de coreanos e era muito engraçado vê-los comer, num enorme balde vinha o frango ensopado, que estava inteiro e os turistas o devoravam sem talheres, fazendo barulhos engraçados para degustá-los, algo considerado anti-higiênico no Brasil.
Depois de uma linda noite de sono, ao amanhecer, descobrimos que nosso hotel dava de frente para um lindo Oasis, e, andando alguns minutos à direita chegamos ao complexo dos templos do sexo. O Local é harmonioso, belo e calmo, a princípio me decepcionei pelo tamanho do complexo, esperava algo maior..
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As imagens esculpidas nos templos, minuciosamente trabalhadas, são fantásticas, a imaginação sexual do mais devaneio dos forasteiros vai às alturas com as diversas esculturas referente ao kamasutra, dentro do templo, algumas colunas bem trabalhadas e no fundo algumas velas ao Deus local, foi lá que encontramos um casal de Brasileiros, finalmente escutávamos alguém falar português, eles vinham de Brasília e rapidamente falamos de nossas impressões sobre a Índia e depois cada qual seguiu seu caminho...
Continuávamos observando as esculturas em cada um dos templos, os animais pareciam ser os preferidos: leões, javalis, elefantes e em cada um deles várias esculturas com atos sexuais diferente, em posições das mais estranhas possíveis, sexo grupal, sexo com animais, sexo em fila, sexo, sexo, sexo...
Descia de um complexo, colocava a bota, chegava em outro complexo, tirava a bota, via várias imagens ao mesmo tempo, sexo com cavalo, o teto do templo, toda aquela formação tridimensional... Entrava dentro e fora do templo e nas fachadas mais sexo, sexo, sexo... Tinha que sair dali, senão ia acabar enlouquecendo, ficar tarado como um indiano...
Almoçamos em um restaurante nas cercanias do templo, o visual era mais bonito do que a comida, a Meire ousou experimentar uma Limca, refrigerante de limão... Voltamos ao hotel, no meio do percurso tirei uma foto de um inseto um tanto estranho, pegamos nossas coisas e voltamos ao terminal de Khajuraho de lá pegaríamos um ônibus até Satna e depois o trem até Varanasi... No terminal encontramos mais uma brasileira, quer dizer argentina, que vivera toda sua vida em Brasília, uma senhora com lá seus 60 anos viajando sozinha pela Índia, alguns vendedores tentavam nos vender alguns adereços relacionados ao kamasutra, lembrancinhas do sexo.
O Ônibus chegou, já imaginava que o caminho seria longo... A jornada durou cerca de seis horas, passando por lugares rústicos, estradas de terra, campos floridos e muitos, muitos indianos subindo e descendo dos ônibus, ao chegar a Satna, novo atraso do trem, pra variar, mais algumas horas a esperar, deu tempo de assistir uma novela indiana na entrada da estação... Estava me acostumando com a mensagem na estação “Delai”, não mais me abalava...
Norma teve mais sorte, o trem que esperava chegou primeiro, nos despedimos. Tomava um nescafé e ficava admirando os ratos nos trilhos... E pensava, quanto tempo mais para o trem chegar...
Marcelo Nogal







A MISSA DO MOCHILEIRO
QUANTO TEMPO FIQUEI: 2 DIAS (VISITANDO OS TEMPLOS DO SEXO NA CIDADE);
COMO CHEGUEI: TREM NOTURNO DE AGRA PARA MAHOBA, DEPOIS ÔNIBUS ATÉ KAJURAHO (8HS DE VIAGEM);
ONDE FIQUEI: GUESTE HOUSE COREIANA;
OBS. (NA MAIORIA DAS VIAGENS QUE FIZ NÃO RESERVEI HOTEL - GERALMENTE FICO NOS MAIS BARATOS, QUE NÃO TEM NOME, NEM SITE NA INTERNET)
O QUE COMI: COMIDA INDIANA;
COMO ME LOCOMOVI: A PÉ PELA CIDADE;
PRA ONDE FUI: ÔNIBUS ATÉ SATNA E DEPOIS TREM ATÉ VARANASI;
