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Relato Varanasi

"Varanasi - No intrínseco toque dos tambores"

Aqui realmente podemos sentir forças ancestrais, espirituais ou que seja... Não sou devoto a nenhuma religião, mas digo, uma energia forte circunda nessa região de mais de dois mil anos... Do lado do Ganga tive minha primeira experiência hindu, como também a pior: angustiante, delirante...

 

Sem querer, perdidos nas infindáveis vielas da antiga Benares, saí de frente ao Crematório, à noite as grandes labaredas de fogo tingiam o céu de laranja, a fumaça se confundia com a neblina extensa, foi quando passei por inúmeras pilhas de madeira, aquele cheiro forte me contagiou!

 

Os sons era que mais me fazia transcender àquele mundo obscuro... Um barulho cortante! Um imenso indiano só de cueca batendo com uma enorme bigorna num prego, para cortar a madeira, me remeteu rapidamente a crucificação de Cristo, não sei o porquê, mas o local me trazia sentimentos de sofrência e angustia, parecia carregado e a batida da bigorna cortante titilava no meu ouvido!

 

E por uma das vielas chegavam os corpos de entes mortos enrolados em tecidos dourados carregado por seus familiares, os homens entravam cantando ou gritando e sumiam no meio das fumaças nas piras, foi algo estonteante!

 

Desciam rapidamente as ghats que davam para o Ganga e quanto mais baixa a casta mais perto do rio o corpo ficava, pude ver um pé dentro de meia furada ser consumido pelas chamas, quanto menor a casta, menos lenha para queimar o corpo...

 

Segui pelas ghats em transe e mais a frente Sadhus encoberto de cinzas recitavam cânticos hindus, seguravam uma vela acesa, o cheiro de incenso dominava o local e a batidas dos tambores, me provocou uma frenesi, era algo cabalístico, invocador, aquela misturas de sinos, tambores ritmados, e, aquele barulho não causava paz na alma, só transtorno, como que libertasse uma energia ruim de dentro de nós... Por um lado era fascinante aquelas sensações, por outro aterrorizante, mas rapidamente saímos dali!

 

Das ghats barcos embarcavam lotados de hindus, de despejavam varias lótus iluminadas pelo rio... Que noite incrível...

 

Depois de tudo o que observei e senti em Varanasi naquela noite tão intensa, ficava difícil dormir... As meninas queriam partir o quanto antes da cidade, não gostaram da experiência espiritual do local, mas ficaríamos mais dois dias por lá, eu queria falar demasiadamente sobre as experiências, as garotas não queriam tocar no assunto, no hostel tinha internet, foi a primeira vez que postei algo no mesmo dia, empolgado com tudo o que sentia...

 

 No hotel por vezes acontecia uns apagões, água quente só raras vezes ao dia, principalmente durante a madruga, mas o preço era bom, o restaurante ficava no terraço onde tínhamos uma vista panorâmica de todo o Ganga, ficava observando dela todo o ritual dos Hindus no Ganga: mergulhar orando no rio com 90% de sua água com coliformes fecais... Eles traziam sabonete, escova de dente, bronzeador, nas ghats os devotos de Ganga se higienizavam por mais paradoxal que possa parecer...

 

À noite foi difícil dormir com todo aquele barulho que vinha das ghats: sinos, cânticos, uma mistura misteriosa de sensações... O corpo em transe queria sair pra fora, andar pela madrugada, mas a mente com medo, me fazia entrar por debaixo das cobertas e ali ficar até amanhecer...

 

Benares é uma cidade com mais de dois mil anos, uma das mais velhas do mundo, imaginem quantos corpos já foram queimados, quantas pessoas vieram morrer nessas margens, pensava sobre essa estranha energia da cidade enquanto tomava o café no terraço do hostel.

 

O Ganga pela manhã ficava coberto com uma forte neblina, aumentando a densidade da mística local, caminhamos pelas diversas ghats, aqui quem nos incomodava eram os barqueiros: “Boat, Sr?” adentrávamos na cidade milenar, em suas vielas longas e complexas, meio que perdidos naquele labirinto encontramos o famoso Shiva Café, local que é o ponto de encontro de mochileiros, lá encontrei meu primeiro amor na viagem, uma garota da Macedônia, mas como tudo é efêmero, lá estava eu em uma das Ghats experimentando pittel, era o que os Indianos mascavam para tirar o mau hálito, foi Baboo quem arrumou um pra mim. Numa folha se misturava várias ervas, inclusive haxixe, Depois de dobrada, mascava a folha, em alguns instantes a boca, os dentes, tudo ficava vermelho e como os indianos, comecei a cuspir por toda a rua, ao mascar pittel sentia um frescor, um gosto de erva na boca...

 

Baboo era um garoto que conhecemos nas ghats do Ganga, aqui as crianças sabem duas ou três línguas e tentam ganhar dinheiro dos turistas, Baboo significa ‘Bebe’ em Hindi... Ele andava com seu irmão, o Little Baboo, foi ele que nos arrumou um barqueiro por um bom preço, foi assim que navegamos pelo Ganga, uma experiência encantadora... Baboo nos levou na loja de seu tio, teríamos que comprar algo, uma espécie de troca de favores por tudo que havia feito por nós sem cobrar nada, tiramos os sapatos, entramos na pequena lojinha, tinha fotos de uma atriz americana que havia comprado na mesma loja. As roupas na loja do Tio do Baboo não agradavam, nem o preço e ele adorava a arte da negociação, perguntava sempre: “Quanto vale isso?” assim tivemos que comprar algo e sair fora dali o mais rápido possível!

 

Atravessamos as vacas e os seus cocôs que eram vendidos como combustível ou se preferir: energia reciclável... Centenas de estátuas de deuses estavam espalhadas pelas ghats, Sadhus dormindo, outros orando, outros conversando...

 

 Andando pela cidade encontramos um cinema Bollywoodiano, entramos para xeretar um pouco e acabamos por descobrir um restaurante, o Spice Café, que foi a melhor descoberta da viagem, a considero como a melhor refeição servida na Índia, por seus temperos, que causavam um aroma maravilhoso a comida, aqui não havia turistas e os garçons não falavam inglês, eles não entendiam nada do que pedíamos e sempre achavam que estávamos insatisfeitos com algo, por várias vezes estava em nossa mesa o garçom, o caixa e o gerente do restaurante tentando nos compreender... A parede cor de rosa dava um charme especial ao local. A noite vinha se aproximando e lá estávamos nós começando a se arrepiar com os cânticos, as garotas não quiseram sair de seus aposentos, eu peguei a filmadora e sai empolgado pelas ghats escurecidas da cidade, para tentar filmar o crematório e o que tinha sentido na noite passada...


Marcelo Nogal

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A MISSA DO MOCHILEIRO 

 

QUANTO TEMPO FIQUEI: 3 DIAS  (VISITEI RIO GANGES E TEMPLOS DE SARNATH);

 

COMO CHEGUEI: TREM NOTURNO DE SATNA - RAILWAYS -;

 

ONDE FIQUEI: SITA GUEST HOUSE - 

 

O QUE COMI: COMIDA INDIANA;

 

COMO ME LOCOMOVI: DE TUCTUC E BARCO PELO RIO GANGES;

 

PRA ONDE FUI: PEGUEI TREM PARA GAYA;

roteiro nogal india

Roteiro Expedição Índia - Nepal

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