top of page

Relato Toledo

ENTRE A ESPADA E O DRAGÃO

 

O trem na Espanha é diferente do que estava acostumado a transitar pelo subúrbio de São Paulo... O design da poltrona a deixa mais confortável: é espaçosa tanto em seu tamanho, quanto em sua distância entre o próximo assento. O movimento cadenciado e sutil do trem ti convida ao descanso, a sonhos quixotescos improváveis durante todo o percurso, ainda mais pra quem está exausto de ter andado tanto nos últimos dias... Comecei a perceber, que pra realizar uma viagem desse tipo, precisaria estar bem condicionado, senão o resultado final seria um desastre...

Depois de duas horas de viagem estávamos na pequena e charmosa estação de Toledo, construídas com tijolos alaranjados. Caminhando alguns metros da estação, já dava pra ver os muros da cidade medieval, estava empolgado como uma criança, tudo era novidade, tudo era a primeira vez... Essa é uma das melhores fazes: “o viajante inocente”, depois que se viaja muito as coisas mudam, fica cada vez mais difícil observar o mundo sem rótulos, sem comparações, apenas tentar compreender sua essência... Sobre o rio Tajo, tinha que cruzar a Ponte de Alcântara, toda rústica e de predas, uma sobre as outras formando dois arcos, com um imenso portal mouro no fim do caminho, fui ao delírio! Cruzar uma ponte medieval hoje... Não sei se a comoção seria a mesma.

No portal, diversas inscrições e desenhos góticos das cruzadas, não resisti e rapidamente subi por uma escada sinuosa até as ameias da muralha, ainda era cedo e os turistas sempre chegam depois das 10hs, diversão exclusiva, me perdia no tempo filmando as muralhas, observava cada detalhe da construção, como tudo era grotesco e colossal.

As ruas eram intituladas em afrescos de azulejo, mais uma herança árabe esculpida pela cidade. Essas ruas eram estreitas e escuras, rodeadas de imensos paredões, você nunca sabia onde a calle ia terminar, se tinha uma saída para esquerda ou direita, parecia que estava andando por um caminho espiral sem volta, as estátuas de Don Quixote pelo caminho, nos atrai a imersão de um mundo ficcioso. nos tornamos o louco cavaleiro andante a procura de Sancho! Observando as armaduras expostas à venda, imagino como era morar aqui na época das cruzadas, como era difícil chegar até o castelo ou na belíssima Catedral Gótica, eu não tenho ideia de quais caminhos prossegui pra chegar até ela, e, muito menos como voltar, tentava me achar no mapa, mas ele era impreciso naquele emaranhado medieval de vielas, o Gloogle Maps ainda não existia, minha mente foi condicionada a cidades construídas com padrões geométricos claros, então ali tinha dificuldades de fugir daquele labirinto sem padrão, também era complicado a arte de fotografar em ruas tão estreitas e escuras, encarnar no personagem de Cervantes era o que me restava...

Visitei um museu visigodo, que conta a história da luta dos nativos locais contra os romanos pela região de Castilla de La Mancha, subindo na torre do museu, onde ficam os sinos, pude ter uma visão privilegiada da cidade medieval, da arquitetura espanhola na construção dos telhados, que ficavam amontoados, casas sufocadas. Na falta de espaço, as calles eram tuneis de minhoca escondidos no horizonte alaranjado. Tudo era muito exprimido, com ares sinistros, talvez meus pensamentos fossem conduzidos por histórias da idade das trevas, da peste negra, de um mundo menos culto, mais religioso, mais quixotesco... Do mar de tijolos laranja, emergia as torres da catedral fincadas no céu.  

Continuar caminhando pelas artérias de Toledo, me proporcionava o inusitado, nunca sabia o que poderia encontrar depois da próxima curva, tinha sempre que escolher entre uma esquerda misteriosa e uma direta enigmática, assim encontrei a Puerta Del Sol, o Palácio de Alcázar, Puerta de Cambrón, Estátua de Afonso VI, Ponte de San Martin, já estava do outro lado da cidade... Ai me veio o questionamento: “O que eu não descobri?” “Do que minhas escolhas desviaram meus olhos?” Essas perguntas vão me perseguir por todas cidades que passar durante minhas viagens...

 

Uma pausa para o café, para refletir sobre o que conheci, contar o dinheiro, planejar a próxima etapa da viagem, fazer uma ligação interurbana pra dizer que está tudo bem comigo, dormir no trem novamente, deixar de ser Quixote... Ainda não, a loucura talvez ainda seja a melhor companheira para um viajante.

;

Marcelo Nogal

toledo dicas de viagem
toledo mochileiros
toledo dicas de viagem

A MISSA DO MOCHILEIRO 

 

QUANTO TEMPO FIQUEI: 1 DIA (CAMINHAR PELA CIDADE MEDIEVAL);

 

COMO CHEGUEI: 

TREM BATE-VOLTA DE MADRID - RENFE - 2 HORAS DE VIAGEM;

ONDE FIQUEI: DEIXEI AS MOCHILAS NO HOSTEL EM MADRID;

 

O QUE COMI: COMPREI LANCHES NUM MERCADO LOCAL, FORA DAS MURALHAS;

 

COMO ME LOCOMOVI: CAMINHEI POR TODA A CIDADE;

 

PRA ONDE FUI: VOLTEI DE TREM PARA MADRID;

bottom of page