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Relato Berlin

DESTINADO A PERCORRER O MURO

Quando se viaja pela Europa, cada país tem suas características mais íntimas, que sintetizam muito bem a cultura da nação. As cidades de Frankfurt, Munique, Colônia mostram muito sobre a cultura alemã, mas a cidade de Berlim... É diferente, parece ser um país, um planeta, algo a parte... Tão diferente, que é até complicado de explicar!

            Na cidade de Berlim falta a cor vermelha! As construções são alaranjadas, os transportes públicos amarelos, o céu azul, os parques verdes e o “Muro” cinza... Parece loucura o que vou dizer agora, mas o Muro de Berlim ainda está lá! Fisicamente boa parte foi derrubada, mas psicologicamente boa parte ainda está de pé, presente em cada berlinense...

            Aluguei uma Bike, próximo à ponte de Oberbaumbrücke, a ideia era percorrer o muro virtual, ou melhor, onde ele ficava fisicamente... Queria descobrir se ainda era capaz de notar diferenças físicas ou sentimentais de ambos os lados, um antigamente era socialista e o outro capitalista. Oberbaumbrücke era meu ponto de partida.O cenário da ponte alaranjada, com o trem amarelado cortando o horizonte blue era lindo! Mesmo sem o toque vermelho na paisagem!

 Na ponte foi gravada uma das cenas do filme “Corra Lola Corra”. Este é meu movie surrealista preferido, que fala sobre o Destino, e, filosofar naquela ponte era uma delicia: pra lá da ponte, no fim do horizonte blue, antigamente o Destino nos levava a Alemanha dominada pelos Russos, do lado que eu sonhava, em cima da Bicicleta, o Destino nos levava a Alemanha dominada pelos Americanos, assim Oberbaumbrücke separava os destinos em tempos de guerra fria... Olhando para o lado socialista, a paisagem parecia ser mais triste, mais humilde, menos arranha-céus, mas era só uma impressão...

Bastou pedalar um pouco e cheguei à East Side Gallery... É o que sobrou do muro atualmente. Agora pinchado, desenhado, rodeado de pousadas e hotéis... Muitos dos desenhos expressa o sentimento dos berlinenses: prisão, dor, busca pela liberdade, sofrimento... Junto a estas metáforas veem as imagens dos países responsáveis pela sua criação, caracterizados muitas vezes com ironia...

A pedalada continuava... Bem distante via a imensa torre de TV, Fernsehturm, era só olhar pra cima e lá estava ela, a me guiar pela cidade. É possível subir na torre de prata e observar a cidade lá de cima por alguns euros, mas preferi continuar seguindo meu destino; aqui, o muro de Berlim era só uma marca no chão da cidade, as pessoas iam e vinham sem dar muita atenção pra cicatriz no chão. Em determinada parte, uma chapa fundida no solo lembrava os mais afortunados daquele local trágico... Se tirasse a cicatriz do chão, nenhum turista perceberia que a cidade um dia foi dividida, as construções modernas eram homogenias.

Cheguei ao Checkpoint Charlie, e pra mim, aquele local era o que menos representava a alma do muro: a guarita, os sacos de areia, os guardas, as fotos penduradas pela rua, as bandeiras tinham um teor mais turístico, algo para ser fotografado, e, pouco sentido... Muita gente querendo registrar com suas máquinas a representação da guerra fria. Os turistas iam até lá, abraçavam o guarda e depois que conseguiam o que queriam, partiam pra comer um Currywurst. Do lado fica o que eles chamam de “Topografia do Terror”, onde antigamente era o centro do comando Nazista de Hitler, se ele soubesse o que o Destino lhe reservaria...

Subindo para o norte, passo por locais históricos e turísticos de Berlim, na região central, passo pelo Portão de Brandenburg, depois pelo bairro de Mitte e finalmente chego num ponto em que o muro ressurge do chão, mas agora ele não vem pintado, vem na sua forma original: cinza... Lá fica o Memorial do Muro de Berlim, e, é tão comovente olhar pra ele, assim cru, sem máscaras, só cinza... E começo a compreender melhor a alma local... Eu o olhando, como se fosse o espelho da alma humana, me sinto com vergonha de fazer parte da humanidade, de ver como ela pode ser tão bruta, mesquinha... Cinza... Se eu sinto as mazelas do mundo, imagina quem vive em Berlim e convive todos os dias com o Muro Virtual! Essas pessoas carregam esse Destino trágico, o Muro, Hitler e todos os soldados nazistas nas costas! Tem vergonha do passado, e, não conseguiram se desprender dele ainda, todos parecem fingir não vê-lo, mas a cicatriz permanece lá, bem no fundo do coração...

 Assim sigo até o parque do Muro, onde ele some novamente no meio do verde, desisto de seguir sua cicatriz, pra mim já é o suficiente, sinto uma necessidade enorme de tomar uma breja genuína e esquecê-lo. Tentar ser feliz como os outros turistas, pedalando sem Destino em uma bicicleta coletiva movida a cerveja e admirar as belas alemãs que vivem em Berlim... Ou melhor: as belas berlinenses que vivem em Berlim. Pelo menos o batom é vermelho!


Marcelo Nogal

Oberbaumbrücke berlim mochileiros
bike muro de berlim mochileiros
berlim bike Fernsehturm mochileiros
berlim bike mochileiros
berlin bike memorial
alemanha-flag.jpg

A MISSA DO MOCHILEIRO 

 

QUANTO TEMPO FIQUEI: 3 DIAS (CAMINHADO PELO CENTRO HISTÓRICO E PEDALANDO AONDE FICAVA O MURO DE BERLIN);

 

COMO CHEGUEI: TREM DE FRANKFURT - BAHN - (6HS);

 

ONDE FIQUEI: BERLIN YOUTH HOSTEL -  23 EUROS;

 

O QUE COMI: COMPREI NO MERCADO PÃO, QUEIJO E SUCO DE LARANJA;

 

COMO ME LOCOMOVI: DE METRÔ, DE BICICLETA (15 EUROS DIA - ALUGUEI PRÓXIMO DA EAST SIDE GALLERY NA WARSCHAUER STREET) 

 

PRA ONDE FUI: PEGUEI ÔNIBUS NOTURNO PARA VARSÓVIA (8HS) - SIMPLE EXPRESS;

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