Relato Areia Branca
CRUZANDO DE BIKE O RIO GRANDE DO NORTE
Areia Branca – Parte 4
Eu adoro tomar café em rodoviárias, principalmente naquelas velhas, pequenas com pouca infraestrutura... Aquele copão de café com leite, pão na chapa, ou uma coxinha de frango requentada, tudo muito sujo e desorganizado... Assim meu dia iniciava em Mossoró. Pelo padrão das cidades que já tinha passado por essa jornada, essa era uma das maiores cidades que tinha visitado...
Cruzei com a Rocinante a cidade potiguar até chegar à BR110, rodovia que tem início lá próximo de Salvador na Bahia e vem findar em Areia Branca. Eu não podia acreditar que este trecho da rodovia estava impecável, sem buracos, com acostamento perfeito e liso. A estrada era bem sinalizada, totalmente o oposto do que tinha encontrado pela minha cicloviagem, dava até gosto pedalar por aqui... Mas isso tinha um motivo! O sal... A maior extração e produção de sal do Brasil ficam nessa região, enfim grandes empresas sempre têm estradas boas para transportar o seu produto...
Antes de Chegar à cidade de Areia Branca, cruzei um trecho da BR110 que dos dois lados da rodovia eram uma imensa salineira da Norsal, aquele trecho parecia uma ponte, foram cerca de três quilômetros de deslumbre com o vento contra, sempre travando o meu progresso... Não foi difícil encontrar na cidade uma pousada por um preço justo. Deixei o alforje no meu quarto e sai empolgado pedalando para desbravar os arredores da cidade...
Vários navios estavam atracados no porto do Rio Apodi, esse é o caminho do sal brasileiro para o exterior, próximo ao porto a bela igreja azul da Matriz...
Queria pedalar pelas salinas, seria a primeira que visitaria em terras brasileiras... Não sofri nenhuma restrição ao entrar pelo portão da Norsal com a Rocinante. O porteiro apena me fritou com os olhos e nada mais... Segui cercado por montanhas de sal bruto, o brilho do sol refletido no sal quase que me cegava, tudo era branco e cristalino, cruzava por caminhões, empilhadeiras e engenhocas bizarras para extração do mineral, depois de cruzar por uma duna de sal que tinha a altura de um prédio de dez andares eu chegava ao fim da Norsal e uma estradinha de terra me levava pra uma praia deserta, a do Pontal...
Aquele local me rendia belas fotos. Inusitadamente cheguei a uma estradinha que cruzava os diques de sal, eu não fazia a menor ideia de qual era o processo químico ali, o fato era que em um dos diques a água era esverdeada, já no outro a água era rosada. Aquelas cores causavam um efeito psicodélico em minhas selfs, algo que jamais tinha visto ou fotografado... E pra abrilhantar meu dia o sol ia se pondo, dando novos tons alaranjados no horizonte para minhas fotos, naquela imensidão de sal. Devido à temperatura diminuir naquele momento do dia, começava encontrar pessoas treinando e correndo nas estradinhas da salineira. Tive um final de tarde memorável em Areia Branca...
A minha estratégia já estava pronta para mais um dia de cicloviagem, combinei com o dono da pousada para deixar meu alforje por lá. Menos peso e mais agilidade era minha proposta para o dia... Pedalar até a Praia do Rosado e voltar para Areia Branca, seria o meu maior desafio da viagem em questão de distância, seriam cem quilômetros percorridos em um único dia, mas eu tinha um plano B, se não conseguisse ficaria uma noite em Porto do Mangue e no outro dia regressaria.
Nesse trecho da cicloviagem o vento era uma grande antítese: vento contra dificultava meu progresso e ficava maios exausto, sem o vento o sol tostava meu cérebro, e, meu corpo aquecia em níveis preocupantes de hipertermia. A RN404 era margeada por diversas torres eólicas. A estrada era um longo tobogã, num infindável sobe e desce cercado pela mata atlântica. Essa era a paisagem por trinta quilômetros com vento contra... Até que cheguei a um restaurante na entrada de Ponta do Mel, bebi um litro de tubaína facilmente e aproveitei para tomar um café reforçado, e, que delicia: Cuscuz com ovo!
Sai do percurso por uma estrada paralela de terra e depois de dois quilometres cheguei ao mirante das três cruzes, a visão era deslumbrante de toda orla da Ponta do Mel. O céu estava totalmente azulado, aquele dia estava perfeito... Aquele mirante também serviu de set para as filmagens do filme brasileiro “Maria, Mãe do Filho de Deus”.
Voltei para a RN404 e seguindo desde a vertiginosa descida da Ponta do Mel até a Praia do Rosado a paisagem era encantadora! Acredito que a mais bonita de toda cicloviagem pelo Rio Grande do Norte. Talvez uma das mais belas estradas a beira mar do Brasil... Tive que fazer uma pausa em um barzinho de estrada para tomar um suco de caju, precisava me hidratar a todo instante, aquele dia estava muito quente. Cheguei ao Parque Dunas do Rosado, outro lugar lindo e quente... Dunas com duas tonalidades de cor: dourada e rosada. Fui com a Rocinante até onde pude, quando começou a afundar na areia, a larguei do lado de um xique-xique e continuei a pé até o cume, naquele momento do dia eu era o único doido a explorar as dunas daquela região, a maioria dos turistas estava se banhando na Praia do Rosado e fazendo passeios de barco pelo mar... Chegando ao cume pude apreciar todo esplendor da orla da Praia do Rosado, mas por pouco tempo, pois lá arriba não tinha nenhuma sombrinha para sentar e admirar o horizonte, devido aquele sol escaldante tive que descer rapidamente, procurei refugio numa parada de ônibus para decidir o próximo passo, a temperatura chegava ao auge, esperei meu corpo refrescar um pouco, então resolvi voltar a Areia Branca naquele mesmo dia.
Parei no mesmo restaurante que comi o cuscuz pela manhã na Ponta do Mel, já passava das quinze horas e eles ainda serviam almoço, mas eu não conseguia comer quase nada, porque a sede era maior, eu só queria beber, me molhar, me refrescar... Faltavam mais trinta quilômetros para chegar à Areia Branca e com o vento a favor meu corpo aquecia demasiado conforme ia pedalando... Até que em um momento extremo meus olhos começaram a escurecer, estava passando em frente a uma empresa: “Fábricas de torres da Aciona!” vi uma sombrinha do lado da guarita, era ali que ia jogar meu corpo pra não ter hipertermia. O porteiro da fábrica me vendo jogado no chão, disse: “Você está passando bem, amigo?” “Meu corpo está fervendo e minha água já esquentou, acredita!” “Pera ai!” O porteiro foi lá dentro da empresa e trouxe uma jarra cheia de água bem geladinha... Sequei a jarra, não sobrou nenhuma gota... Chupei algumas balas de hortelã que levava comigo pra esses momentos de dificuldade e depois de uma meia hora se recuperando estava pronto para continuar minha jornada, ai vinha aquele pensamento novamente em mente: “Será que estou preparado para essa viagem?”
Novamente motivado pela sede, sai da estrada principal e segui um caminho para a Praia de Cristovão, só que acabei indo por uma estradinha errada chegando a um local sem saída no meio de dunas e torres eólicas, desisti de ir para Cristovão e voltei para a estrada principal... A vida é assim, aceitar algumas derrotas para não perder a guerra... E lá pelas 17hs chegava exausto à Areia Branca, aquela tinha sido a maior distância percorrida de bicicleta na minha vida, apesar do cansaço estava satisfeito.
Depois de uma noite de sono profundo e intenso voltei pedalando para Mossoró pela melhor estrada do Estado, a do Sal... Desmontei a Bike e segui de ônibus até Caicó. E de Caicó outro ônibus até Acari, assim passei a minha tarde, viajando pelas estradas potiguares, que nem gente normal.
Marcelo Nogal










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A MISSA DO MOCHILEIRO
QUANTO TEMPO FIQUEI: 2 DIAS
SALINEIRA
PONTA DO MEL
DUNAS DO ROSADO
COMO CHEGUEI: MOSSORÓ (50KMS DE BIKE)
ONDE FIQUEI: HOSPEDADO PRÓXIMO AO TERMINAL RODOVIÁRIO;
O QUE COMI: COMI CUSCUZ COM OVO;
COMO ME LOCOMOVI: DE BIKE PELAS PRAIAS;
PRA ONDE FUI: VOLTEI PARA MOSSORÓ